Vivemos no século XXI, onde a tecnologia está em constante e crescente evolução, mas pouco falamos sobre os prejuízos no neurodesenvolvimento infantil causado pelo uso excessivo de aparelhos eletrônicos. Com os avanços tecnológicos, o uso de eletrônicos se intensificou significativamente, em idades cada vez mais precoces. É raro ver uma criança ou adolescente que não tem ou teve contato com aparelhos eletrônicos, seja assistindo um desenho na televisão, jogando no computador, navegando pelas redes sociais no celular ou brincando no tablet. Encontrar o equilíbrio entre o uso de telas e a saúde das crianças é um desafio para pais e profissionais. Mas é importante nos conscientizar que, mesmo que seja difícil evitar completamente o uso de aparelhos eletrônicos, a mínima exposição durante a infância pode impactar negativamente o desenvolvimento neurológico das crianças.
Apesar dos benefícios trazidos pelas tecnologias, principalmente no ramo científico e acadêmico, existem claros impactos negativos em seu consumo desenfreado, principalmente no desenvolvimento infantil. O que já foi comprovado cientificamente é que, o uso demasiado de aparelhos eletrônicos provoca mudanças estruturais no cérebro, como atrofia ou afinamento prematuro do córtex; diminuição da receptividade das informações sensoriais; alterações no sono, aumento significativo da Dopamina no córtex cerebral etc. Todas essas mudanças provocam atrasos significativos no neurodesenvolvimento de uma criança, tanto no desenvolvimento físico, como cognitivo, principalmente, na área da linguagem e no domínio das habilidades sociais.
O uso excessivo de telas altera o sono da criança
Sabemos que o sono é uma necessidade humana básica, um processo fisiológico essencial para o desenvolvimento do ser humano. Enquanto dormimos, nosso cérebro realiza funções extremamente importantes como a consolidação da memória, a termorregulação, a conservação e restauração da energia, e restauração do metabolismo energético cerebral.
A privação ou desregulação do sono tem impactos a médio e longo prazo no sistema cognitivo (atenção, memória e raciocínio), além de comprometer o desempenho funcional do indivíduo. O sono se divide em estágios (NREM e REM), a quantidade de sono é regulada por fatores homeostáticos, relacionados a mecanismos que promovem sonolência, e pelo ciclo circadiano. Ciclo circadiano é o nome dado ao ritmo em que o organismo realiza suas funções ao longo de um dia. Esse ciclo é controlado pelo núcleo supraquiasmático do hipotálamo. A atividade dos neurônios, que compõem o supraquiasmático, está relacionada com estímulos ambientais como a luminosidade, assim, o ciclo circadiano está diretamente ligado ao dia e à noite.
A claridade do amanhecer estimula a liberação de cortisol, o hormônio que nos deixa despertos. Ao anoitecer, inicia-se a produção de melatonina, o hormônio que induz ao relaxamento e ao sono. A produção de melatonina é anulada na presença de luz.
A utilização de dispositivos eletrônicos como computador, tablet, celulares, podem inibir a produção de melatonina. O uso excessivo da tecnologia, baseada em iluminação artificial, tem um efeito muito negativo sobre a qualidade do sono. Distúrbios do sono podem gerar na criança e adolescente um baixo desempenho escolar, já que é durante o sono que acontece a consolidação do conhecimento. O aprendizado acontece com as mudanças estruturais dos neurônios, a neuroplasticidade. Durante o processo de aprendizagem, a atividade neuronal sofre diversas modificações, nesse momento as sinapses são fortalecidas ou enfraquecidas. A memória surge quando há aprendizado, sendo que o mecanismo de consolidação acontece durante o sono.
Por que as telas criam dependência?
Paiva e Costa (2015), afirmam que a tecnologia causa impactos em diversas áreas da vida da criança, desde o convívio social escasso, até na influência exercida na saúde física e mental.
Várias pesquisas têm mostrado que o uso prolongado de aparelho eletrônicos pode provocar algum tipo de dependência, pois alteram a neuroquímica do indivíduo. Esses fatores neuroquímicos estão relacionados à elevação dos níveis de dopamina no cérebro, que é o neurotransmissor associado ao prazer, modificando e trazendo prejuízos no sistema de recompensa do indivíduo.
As pessoas neurotípicas nascem com um sistema de recompensa no cérebro, que as deixam suscetíveis a comportamentos viciantes. Quando nos envolvemos em uma atividade que nos recompensa com uma sensação de prazer, temos a tendência de repeti-la. A repetição dessa atividade pode causar dependência.
O Distúrbio de Dependência de tela tem se tornado cada vez mais comum entre crianças, adolescentes e até mesmo adultos. Alguns estudos têm mostrado que pessoas que apresentam esse distúrbio podem apresentar diferenças estruturais no cérebro, principalmente na região do córtex frontal e nas estruturas límbicas.
Entenda como reduzir os danos das telas:
É importante que os responsáveis fiquem atentos às diretrizes pediátricas para o uso de telas por crianças, uma vez que, como citado algumas vezes durante o artigo, o tempo excessivo em dispositivos eletrônicos trazem impactos negativos no desenvolvimento dos pequenos.
Segue algumas recomendações gerais:
- Limite o tempo de tela: De acordo com recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), o uso de telas na infância deve ser restrito. Crianças menores de 2 anos de idade, por exemplo, não devem ter acesso algum. Entre 2 e 5 anos, permanência máxima de uma hora por dia. Entre 6 e 10 anos, o tempo deve ser de até duas horas.
- Escolha Conteúdos Adequados: Priorize conteúdo educacional e apropriado para a idade do seu filho. Verifique classificações etárias e controle o acesso a conteúdo inadequado.
- Estabeleça horários: Defina horários específicos para o uso de telas, equilibrando-os com atividades ao ar livre, interações sociais e tempo de qualidade em família.
- Esteja envolvido: Os pais devem estar envolvidos e cientes do que seus filhos estão fazendo online. Isso inclui monitorar e conversar sobre o conteúdo.
- Desconecte antes de dormir: Evite o uso de telas pelo menos uma hora antes de dormir para preservar um sono saudável.
- Seja exemplo: Os pais devem servir como modelos de comportamento saudável em relação ao uso de telas, demonstrando moderação e equilíbrio.
- Tempo de qualidade: Promova atividades off-line com seu filho, promova a interação social, como brincadeiras ao ar livre, esportes e leitura. E lembre-se: A atenção que a criança recebe quando ainda pequeno, fará toda a diferença em sua vida adulta.
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Por Miriam Stampini
Neuropsicopedagoga e Coordenadora do Ensino Fundamental Anos Iniciais